“Amo-te, não porque me dás o céu ou o inferno, mas por seres o que és”. S. Francisco Xavier.
Por vezes somos tentados a pedir que Deus nos dê algo, uma casa, um carro, como se estas coisas pudessem surgir de outra coisa, a não ser do nosso esforço e do pôr em prática os dons que temos conosco, para conseguir tais coisas.
Não podemos exigir de forma alguma que Deus faça a figura do Diabo no deserto, que oferece à Jesus as riquezas deste Mundo, em troca da sua adoração. Por vezes talvez façamos o mesmo em sentido contrário. Talvez ofereçamos a nossa adoração a Deus em troca de bens terrenos. Parece estar em contradição com isto que afirmo, o Pai Nosso, quando nos fala do pão, que sem dúvida alguma, é um bem terreno e material, quando diz: “Dai-nos o pão-nosso de cada dia”. Não nos diz dai-nos o pão de todos os dias (“Jesus de Nazaré”, Bento XVI), mas simplesmente o indispensável, para sobreviver para aquele dia. Aquilo que não podemos de forma alguma dispensar.
Quando pedimos algo que podemos dispensar, para aquele dia (e até para o próximo), não estamos de forma alguma a fazer o que nos diz o Pai Nosso. Esta parte da oração do Pai-Nosso interpela-nos para que usemos a oração com dignidade, pedir só aquilo que nos aflige, que nos constrange do fundo do nosso espírito e não o supérfluo. Fazer aquilo que nos diz um dos mandamentos, não usar o nome de Deus em vão.
Para compreender de que forma Deus nos dá o pão-nosso de cada dia temos que nos acercar, do evangelho de Lucas:”Qual o pai de entre vós que se, o filho lhe pedir pão, lhe dará uma pedra? Ou se lhe pedir um peixe lhe dará uma serpente? Ou se lhe pedir um ovo, lhe dará um escorpião? Pois se vós que sois maus sabeis dar coisas boas aos vosso filhos, quando mais o Pai do Céu, dará o Espírito de Santo àqueles que lho pedem.”(Lc 11, 11-13). Reparem que Deus não dá o pão nem o peixe nem o ovo pronto e servido na mesa, dá-se sim, a si mesmo, porque Deus é um dom, por si mesmo, que compreende um conjunto de dons, que são dados ao homem, para que ele realize a sua vida. E um dom é como uma ferramenta que usamos emprestada, para cavar a terra, para colher as uvas da vinha, ou fazer outra tarefa da nossa vida. Porventura ninguém vê a enxada cavar sozinha, ou a tesoura a cortar as uvas sem as mãos humanas. É preciso que o homem use os dons do Espírito Santo, tal como diz o evangelho, para fazer tais coisas. Deus age como o ferramenteiro, ou como o senhor da parábola dos dons (Lc 19, 11-28), que empresta as suas ferramentas, para que o homem as ponha a render. Mas sem o esforço do homem, nenhum dom, pode fazer nada. Nenhum pão será posto à mesa.
Isto leva-me a mais outra reflexão. De que vale sentirmo-nos orgulhosos por sermos inteligentes, ou bons em atividades manuais, ou termos jeito para artes, se isso foi-nos dado de graça? O nosso mérito não é esse. O nosso mérito é aperfeiçoarmo-nos no uso dessas ferramentas e usá-las com a máxima reverência possível. Podemos ser orgulhosos por ser muito trabalhadores e por usar muito e bem as ferramentas que nos são dadas, porque isso é mérito nosso, mas, mais nada além disso é mérito nosso. Lembrem-se que o fato de um pescador ter uma vara mais comprida, não faz dele melhor pescador. Porventura o pescador que tiver uma vara mais curta, pode até demorar mais tempo, mas vai conseguir pescar tanto ou mais peixe que aquele que tem uma vara mais comprida. Geralmente acontece que aquele que tem a vara mais comprida, confiante na sua ferramenta, torna-se preguiçoso e orgulhoso, enquanto o outro humilde e com a vara mais curta, é trabalhador e esforçado. Alguém tem dúvidas de quem vai tirar mais peixe? Pode acontecer que aquele que tem a vara mais curta se aperfeiçoe no seu uso, e consiga assim pescar peixe suficiente, para não só subsistir, mas para comprar uma vara mais comprida. Na parábola dos dons isso também nos é dito ou seja o número de talentos é aumentado, àquele que pôs os seus talentos a render.
Porque a diferença na vida, não está no tamanho da ferramenta, mas na quantidade e na qualidade de uso que lhe damos. O evangelho também diz : “A quem mais for dado mais será pedido”. É isso que nos ensina tanto o evangelho de Lucas (11,11-13), como a parábola dos dons.
Deus vos abençoe.
Vitor Ribeiro – Portugal
vitor.ribeiro@ua.pt
Autor-colaborador do Blog Cotidiano Espiritual
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