Por que quanto mais se avança no conhecimento e fé em Deus, maior é
a sensação de indignidade?
Quanto mais noção se tem, de modo bem existencial, do imenso Amor deste Deus que vive eternamente, e que tudo dá a vida, quanto mais nos abeiramos da poderosa e sublime e imensa santidade do nosso Deus, mais clara, evidente e iluminada fica a pobreza moral do sujeito, mesmo que não seja muita.
Uma pequena falta, no inicio do caminho, parece não ser nada. Mas, à medida que a Luz aumenta de intensidade, devido ao caminho cristão, e à aproximação "dessa luz imensa que é Deus" (irmã Lucia, Fátima, 1917), essa falta, essa imperfeição ganha contornos subjetivos (leitura e interpretação do sujeito) mais negros, mais visíveis, pois quanto maior é a aproximação do Amor, mais evidente se torna a gravidade do desamor.
Por isso, bem que diz Isaias: "Ai de mim, estou perdido! Com efeito, sou homem de lábios impuros, e vivo no meio de um povo de lábios impuros, e os meus olhos viram o Rei, Iahweh dos Exércitos" (Is 6,5).
Se é o Senhor o critério único, final, pleno, de avaliação das ações morais, pois bem, à medida que Ele se torna mais "próximo", mais clara fica a gravidade do desamor (gosto de substituir pecado por desamor). A nossa pequena ofensa, ingratidão, ganha pesos infinitos diante da infinita bondade e santidade de Deus.
Lembram-se da parábola daquele homem que rezava no Templo, junto ao altar, agradecendo por ser justo e não como o resto dos homens, e outro estava na entrada pedindo perdão, pois nem ousava levantar os olhos? Bem sabem quem foi, segundo diz Jesus, justificado! Atendendo ao que agora foi dito, podemos interpretar de modo mais profundo, intimo, espiritual, esta parábola. O tal justo da parábola não fez aproximação a Deus, não se lhe descobriu, ou não se lhe tornou perceptível o seu pecado, por mais pequeno que seja. E por quê? Porque, quanto mais nos aproximamos de Deus, maior é a sensação de indignidade. E a realidade de Deus exige que esta sensação seja um facto, a ponto de se dizer:
"Sim, sou muito indigno; simplesmente nem tinha noção do quanto indigno sou, justamente porque não tinha noção do quanto Belo Sois; por isso, a Vossa Beleza inesgotável, fonte de qualquer beleza, reduz a um aborto moral o que, à partida, era uma coisa que nem se percebia.
Mas, seremos nós, para Vós, abortos morais? De facto, somos. Somos miséria, caducidade, contingência, à beira do nada. Mas, muda tudo de figura quando descobrimos, Senhor Deus, que na Pessoa do teu verbo abraçaste, amaste e assumiste em absoluto o que somos. Até chegaste ao cúmulo, Tu, que és a fonte de toda a santidade, de aceitares seres batizado no batismo de penitência de João Batista, afim de seres contado entre os pecadores. Ficou claro para nós o sentido desse batismo. Mas o teu batismo (mergulho) não ficou por aqui. Aceitastes, assumistes a morte; o Teu Verbo entrou na nossa morte, Ele que É autor e fonte de todo o existir, de toda a vida. Agora, até a nossa morte se tornou divina, pois ao sofrer e morrer, sei que sofro inserido em Ti, pois a nossa morte se tornou Vossa. Seja Vossa Senhor, a nossa noite.
Sem Vós NADA podemos fazer. Pena seja, Senhor Deus, que seja tão difícil nos recordarmos disto.
Mas Vós nos amais, não como deveríamos ser, mas como somos.
Faze-nos recordar hora a hora, minuto a minuto, esse Vosso amor por nós. Pois assim, tudo, dores, alegrias, cansaços, problemas, tudo será vivido como uma dádiva, e assim aquele paraíso original, por Vós desejado para nós, mas nunca possuído de fato, começará a acontecer na vida, e a nossa vida, cheia do Vosso Amor, será o mais belo jardim, regado pelo rio do Vosso Espírito.
Que pena, Senhor, que os homens não percebam que não é fábula, nem mito, nem coisa de gente fraca de mente, acreditar em Vós. Pois que, se existes necessariamente, criastes não por determinismo, mas por Suprema liberdade - criaste por Amor.
O teu apóstolo diz que És Amor. Pois o amor é entrega. Mas se o Teu Amor é sem medida, então que morra em nós qualquer ideia de um deus altivo, sentado no trono, distante, e cresça em nós a ideia de um Deus INFINITAMENTE POBRE, DADO, ENTREGUE, OFERECIDO, DESPOJADO, ESVAZIADO DE SI.
Por: Rui Miguel Silva (PORTUGAL)
– autor do Blog Cotidiano Espiritual
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