quinta-feira, 6 de agosto de 2015

Milagre da multiplicação ou da partilha?

milagre da multiplicação ou da partilha?

Milagre da multiplicação ou da partilha?

Por: Renato Silveira

Existe um debate muito polêmico  acerca da famosa passagem descrita no evangelho de Mateus onde Jesus supostamente, ou mesmo factualmente, multiplica os pães para que a multidão que o ouvia pregar pudesse saciar a fome. Conta-se nos textos que havia muita gente no local  já fazia bastante tempo e havia apenas 5 pães e 2 peixes. Vamos relembrar:
Caía a tarde. Agrupados em volta dele, os discípulos disseram-lhe: Este lugar é deserto e a hora é avançada. Despede esta gente para que vá comprar víveres na aldeia. Jesus, porém, respondeu: Não é necessário: dai-lhe vós mesmos de comer. Mas, disseram eles, nós não temos aqui mais que cinco pães e dois peixes. Trazei-mos, disse-lhes ele. Mandou, então, a multidão assentar-se na relva, tomou os cinco pães e os dois peixes e, elevando os olhos ao céu, abençoou-os. Partindo em seguida os pães, deu-os aos seus discípulos, que os distribuíram ao povo. Todos comeram e ficaram fartos, e, dos pedaços que sobraram, recolheram doze cestos cheios. Ora, os convivas foram aproximadamente cinco mil homens, sem contar as mulheres e crianças.” (Mt 14, 15-21).

Para os teólogos mais tradicionais e conservadores, o milagre dos pães permanece como milagre da multiplicação. Significa que realmente Jesus operou um milagre sobrenatural enchendo os cestos de pães. Já para alguns teólogos modernos (especialmente os partidários da teologia da libertação) esse milagre nada mais foi do que um milagre da partilha. Significa que, as pessoas foram colocando nos cestos o que tinham, e assim foi-se enchendo os cestos a ponto de todos poderem comer.
Mesmo sendo o Cotidiano Espiritual um blog católico, nesse artigo nós não iremos tomar partido sobre nenhuma das duas interpretações. A intenção é levarmos o leitor a tomar suas próprias conclusões e tentar mesclar os dois modos de ver para que não se torne uma guerra, mas sim um complemento entre uma teoria e outra.


Primeiramente o que devemos ter em mente é que a mensagem da partilha e da caridade, acompanharam em grande parte as palavras de Jesus nas escrituras. O tempo todo que Jesus pregava, na maioria das vezes ele chamava a atenção para que fossemos caridosos e partilhássemos as coisas com os mais necessitados.  Por exemplo, na primeira carta que São João nos escreve: “Quem possuir bens deste mundo e olhar o seu irmão sofrer necessidade, mas lhe fechar o seu coração, como pode estar nele o amor de Deus? Meus filhinhos, não amemos com palavras nem com a língua, mas por atos e em verdade.” (1 João 3, 17-18). Portanto, não se pode chamar por cristão alguém que não partilha, que não pratica a caridade. A caridade e a partilha devem estar nas atitudes e no coração de um cristão de forma natural.
Ao mesmo tempo, não podemos menosprezar o poder de Deus, e achar que Jesus apenas veio ao mundo como um “assistente social” ou um “revolucionário” da paz. Ele também tinha a missão de divinizar o homem e de nos trazer a salvação por meio da cruz.


Separei dois testemunhos históricos verdadeiros para integrar com esse nosso artigo. Afinal, mesmo que raramente, os milagres acontecem como sinais que dialogam com a nossa crença. Faremos uma analise desses dois testemunhos para que possamos tentar esclarecer um pouco do que estamos estudando hoje.
O primeiro fato que vamos contar é o de Santa Zita (padroeira das empregadas domésticas). Santa Zita viveu entre 1218 e 1278. Era uma empregada doméstica muito pobre mas, mesmo assim, sempre partilhava o que tinha, sua comida, suas roupas. E, com autorização de seus patrões, às vezes pegava o que sobrava na dispensa e distribuía aos pobres.  Mas quase nunca seus patrões permitiam isso. Numa época de grande escassez distribuiu aos pobres grãos que se encontravam na dispensa. Quando chegou o furibundo capataz para contar os grãos, os encontrou todos ali, nunca se explicando como o fato tinha ocorrido.
O Segundo (de forma bem resumida) é o de São Felipe Neri, que viveu entre 1515 e 1595. Era um padre que se dedicava o tempo todo aos pobres e necessitados. Certa vez, sabendo de um lugar onde havia crianças muito miseráveis e órfãs, levou uma panela de sopa que esquentou e dividiu com todos. Mas eram muitas crianças e uma pequena panela não daria conta de saciar a fome de todos.  Mesmo assim, o pouco que tinha dividiu com todos. Quando Felipe Neri já estava recolhendo tudo pois acabara a sopa, se deparou com a panela cheia novamente em suas mãos, dando assim, para encher cada prato das crianças novamente.


Esses relatos nos provam que poderia ser completamente possível um milagre sobrenatural de Cristo, a partir do momento que ele viu a boa vontade, a fé e a caridade daquelas pessoas que o ouviam.

Concluindo:

Não há como afirmarmos com exatidão o que aconteceu exatamente naquele momento, se foi um milagre sobrenatural ou um milagre da palavra de Jesus que tocou  o coração das pessoas e moveu-as a se ajudarem dando o que tinham para partilhar com as outras pessoas, ou ambos.
Mas o que podemos afirmar é que, olhando a história da igreja e de seus santos, podemos tirar 2 conclusões; primeira que Jesus poderia ter feito o milagre da multiplicação de forma sobre-humana, pois se com os santos citados foi feita, Jesus poderia fazer também. A segunda é que, independente de qualquer coisa, Deus se move a fazer um milagre, partindo do nosso coração caridoso. Ou seja, mesmo que o milagre seja da multiplicação, o início desse milagre sempre será pela partilha, pela caridade. Quando São Felipe Neri coloca a sopa para as crianças, não sabia que ocorreria um milagre, apenas partilhou, o mesmo aconteceu com santa Zita, ela não foi contando que o milagre aconteceria, mas a partir de suas atitudes Deus deu a retaguarda para eles. Deus faz a parte Dele quando fazemos a nossa de coração.

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