Poema de Natal
Mulheres atarefadas
Tratam do bacalhau,
Do peru, das rabanadas.*
Tratam do bacalhau,
Do peru, das rabanadas.*
-- Não esqueças o colorau,
O azeite e o bolo-rei!
- Está bem, eu sei!
- E as garrafas de vinho?
- Já vão a caminho!
- Oh mãe, estou pr'a ver
Que prendas vou ter.
Que prendas terei?
- Não sei, não sei...*
Num qualquer lado,
Esquecido, abandonado,
O Deus-Menino
Murmura baixinho:*
- Então e Eu,
Toda a gente Me esqueceu?*
Senta-se a família
À volta da mesa.
Não há sinal da cruz,
Nem oração ou reza.
Tilintam copos e talheres.
Crianças, homens e mulheres
Em eufórico ambiente.*
Lá fora tão frio,
Cá dentro tão quente!*
Algures esquecido,
Ouve-se Jesus dorido:*
- Então e Eu,
Toda a gente Me esqueceu?*
Rasgam-se embrulhos,
Admiram-se as prendas,
Aumentam os barulhos
Com mais oferendas.
Amontoam-se sacos e papeis
Sem regras nem leis.
E Cristo Menino
A fazer beicinho:*
- Então e Eu,
Toda a gente Me esqueceu?*
O sono está a chegar.
Tantos restos por mesa e chão!
Cada um vai transportar
Bem-estar no coração.
A noite vai terminar
E o Menino, quase a chorar:*
- Então e Eu,
Toda a gente Me esqueceu?
Foi a festa do Meu Natal
E, do princípio ao fim,
Quem se lembrou de Mim?
Não tive tecto nem afecto!*
Em tudo, tudo, eu medito
E pergunto no fechar da luz:*
- Foi este o Natal de Jesus?!!!*
*
(João Coelho dos Santos
in Lágrima do Mar - 1996)
O meu mais belo poema de Natal*
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